O ESTATUTO DO COOPERADOR - Proposta de Linhas de Reforma
Deolinda Meira Docente do Instituto Politécnico do Porto/ ISCAP / CEOS.PP Diretora do Mestrado em Gestão e Regime Jurídico-Empresarial da Economia social . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1. INTRODUÇÃO
No estado atual da legislação cooperativa, os ramos cooperativos em que as relações cooperativas têm por objeto principal a prestação de trabalho por parte dos cooperadores são os ramos de produção operária (Decreto-Lei n.º 309/81, de 16 de novembro), de serviços, na modalidade de produtores de serviços (Decreto-Lei n.º 323/81, de 4 de dezembro), de artesanato (Decreto-Lei n.º 303/85, de 12 de novembro), de pescas (Decreto-Lei n.º 312/81, de 18 de novembro), de ensino (Decreto-Lei n.º 441-A/82, de 6 de novembro) e de cultura (Decreto-Lei n.º 313/81, de 19 de novembro). Nestas cooperativas, a aquisição e manutenção da qualidade de membro da cooperativa dependerá, obrigatoriamente, da sua contribuição para a cooperativa com capital e trabalho. Esta contribuição com trabalho faz parte do conteúdo do ato jurídico através do qual se opera a aquisição da qualidade de membro, sendo, por isso, um elemento necessário à aquisição da qualidade de cooperador A contribuição de trabalho consistirá na prestação, segundo regras definidas pelos estatutos, pela assembleia geral ou pelo órgão de administração, da atividade profissional dos cooperadores no contexto da cooperativa. Nesta, os cooperadores pretendem exercer a sua profissão em condições de trabalho aceitáveis e justas, sem dependerem de um poder externo, seja ele público ou privado, ou prestarem um serviço sob a responsabilidade de todos os que trabalham na cooperativa. De facto, a cooperativa é criada com vista a eliminar o intermediário especulador, pela assunção direta, por parte dos cooperadores, da função da empresa, relegando -se assim o ente social (a cooperativa) para o papel de simples instrumento de articulação e ativação de um determinado grupo (o dos cooperadores), com vista à satisfação das necessidades deste grupo em condições mais favoráveis do que seriam obtidas com a intervenção de intermediários. Como destacava Cunha Gonçalves, as cooperativas têm a ambição de «libertar os operários do regime do salariado, da exploração capitalista, eliminando o patrão, visto que os trabalhadores, associando-se e produzindo em comum, se apropriam do lucro da produção, sendo patrões de si próprios».[1] No ordenamento português não existe um regime jurídico próprio para os cooperadores trabalhadores. Esta ausência conduz à autorregulação e que se tem traduzido, na maior parte destas matérias, na aplicação prática pelas cooperativas do mesmo regime a que estão sujeitos os trabalhadores não cooperadores. A ausência de um regime jurídico próprio para os cooperadores trabalhadores decorre, eventualmente, da circunstância de o legislador português não se pronunciar quanto à natureza jurídica do vínculo que une o cooperador trabalhador à cooperativa. Com efeito, ao contrário do que sucede em outros ordenamentos (como no italiano, no espanhol e nos latino-americanos), o legislador português não tomou posição sobre a questão da qualificação jurídica da relação entre o cooperador trabalhador e a cooperativa. [1] - GONÇALVES, C., Comentário ao Código Comercial português, volume I, Empreza Editora J. B., Lisboa, 1914, p. 541. |