EDITORIAL
Eduardo Graça Presidente da CASES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Esta revista em formato digital que intitulámos de Economia Social – Leituras & Debates, com periodicidade trimestral, chega ao n. º5 cumprindo a primeira fase de um projeto que pretendemos aprofundar em continuidade.
Os temas abordados neste número são diversos e apraz-nos assumir essa diversidade, afastando-se, desta vez, da unidade temática. A economia social, em suas manifestações e protagonistas, é uma realidade diversa que se move silenciosamente e se transforma, transformando a realidade social em que mergulha as suas raízes. Cumpre-me agradecer a colaboração de todos os ilustres convidados que aceitaram colaborar neste número e, em especial, do Coronel António Salgueiro, diretor do Colégio Militar, a propósito da Exposição Tributo a António Sérgio, aluno daquela prestigiada instituição de ensino, e do Prof. Adelino Maltez que através de um sentido testemunho presta homenagem ao Prof. Jorge de Sá, recentemente falecido, que sempre nos honrou com o seu apoio entusiasta, e esclarecido, nas complexas tarefas da reforma no setor da economia social. O tempo em que vivemos tende a desvalorizar a continuidade, e previsibilidade, das políticas e consequentemente dos programas, projetos e ações que visam concretizá-las, lançando o debate para temas, a mais das vezes de circunstância, grados à mediatização para consumo imediato. A enxurrada de informação em que se mistura a verdade, da qual se desconfia, com a mentira, tornada verdade, torna mais exigente a tarefa de todos aqueles que resistem ao imediatismo em favor da valorização do tempo necessário à maturação das ideias com futuro. A economia social é um setor constituído por uma constelação de entidades que resultam de um longo processo de afirmação do movimento associativo, ou seja, da auto-organização dos cidadãos em prol da defesa de causas e de interesses legítimos que não cabem na esfera dos setores público e privado (lucrativo). A legislação de enquadramento do setor da economia social, enraizando na Constituição da República Portuguesa, é robusta e abrangente de todos os seus subsetores, não permitindo sustentar com um mínimo de razoabilidade a sua reiterada subalternização face aos setores público e privado. Por outro lado, carateriza-se, na sua quase plenitude, por obter aprovação unanime de todos os quadrantes políticos, tendo vindo a ser debatida, adotada e aplicada, ao longo do tempo, sem descontinuidade, na vigência de diversos governos.
Estando a economia social dotada, a nosso ver, de um edifício jurídico legal robusto, atenta às raízes históricas dos diversos subsetores que a integram, fundadas em duas tradições que confluem nos princípios e valores, mas conflituam, por vezes, nos objetivos que prosseguem (o movimento associativo livre e a ação social da igreja católica), carece de uma permanente reflexão e continuada reforma. A Constituição da República Portuguesa consagrou o setor da economia social, sob a designação de “setor cooperativo e social” a par, e com a mesma dignidade, dos setores público e privado. Não é demais sublinhar esta sua especificidade face à maioria das Constituições dos países da EU: Artigo 82.º (Sectores de propriedade dos meios de produção) 1. É garantida a coexistência de três sectores de propriedade dos meios de produção. 2. O sector público é constituído pelos meios de produção cujas propriedade e gestão pertencem ao Estado ou a outras entidades públicas. 3. O sector privado é constituído pelos meios de produção cuja propriedade ou gestão pertence a pessoas singulares ou colectivas privadas, sem prejuízo do disposto no número seguinte. 4. O sector cooperativo e social compreende especificamente: a) Os meios de produção possuídos e geridos por cooperativas, em obediência aos princípios cooperativos, sem prejuízo das especificidades estabelecidas na lei para as cooperativas com participação pública, justificadas pela sua especial natureza; b) Os meios de produção comunitários, possuídos e geridos por comunidades locais; c) Os meios de produção objecto de exploração colectiva por trabalhadores; d) Os meios de produção possuídos e geridos por pessoas colectivas, sem carácter lucrativo, que tenham como principal objectivo a solidariedade social, designadamente entidades de natureza mutualista. A Lei de Bases da Economia Social, (Lei n.º 30/2013, de 8 de maio), aprovada por unanimidade pela Assembleia da República, estabelece: “Artigo 1.º Objeto A presente lei estabelece, no desenvolvimento do disposto na Constituição quanto ao sector cooperativo e social, as bases gerais do regime jurídico da economia social, bem como as medidas de incentivo à sua atividade em função dos princípios e dos fins que lhe são próprios.” Após a aprovação da Lei de Bases da Economia Social encetou-se, ou prosseguiu com um novo enquadramento, a reforma da legislação ordinária da qual, considerando somente Leis e Decretos-Leis, se enumeram um conjunto de diplomas relevantes, por ordem cronológica: Decreto-Lei n.º 165-A/2013, de 23 de dezembro Cria o Fundo de Reestruturação do Sector Solidário, que tem por finalidade apoiar a reestruturação e a sustentabilidade económica e financeira das Instituições Particulares de Solidariedade Social e equiparadas, permitindo a manutenção do regular desenvolvimento das respostas e serviços prestados. Decreto-Lei n.º 172-A/2014, de 14 de novembro Procede à quinta alteração ao diploma que aprovou o Estatuto das Instituições Particulares de Solidariedade Social (Decreto-Lei n.º 119/83, de 25 de fevereiro). Decreto-Lei n.º 44/2015, de 1 de abril Procede à segunda alteração ao diploma que cria o Fundo de Reestruturação do Setor Solidário e estabelece o seu regime jurídico. Decreto-Lei n.º 120/2015, de 30 de junho Estabelece os princípios orientadores e o enquadramento a que deve obedecer a cooperação entre o Estado e as entidades do setor social e solidário. Lei nº 76/2015, de 28 de julho Alteração ao diploma que altera o Estatuto das Instituições Particulares de Solidariedade Social, por apreciação parlamentar, no sentido de integrar as cooperativas de solidariedade social, desde que credenciadas pela CASES, numa das espécies de IPSS, ficando abolido, assim, o regime de equiparação então vigente. Lei n.º 119/2015, de 31 de agosto Aprova o Código Cooperativo (revoga a Lei n.º 51/96, de 7 de setembro). Lei n.º 150/2015, de 10 de setembro Altera o Código Civil, e procede à primeira alteração à Lei-Quadro das Fundações (Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de novembro de 1966 e Lei n.º 24/2012, de 9 de julho). Decreto-Lei n.º 68/2016, de 3 de novembro Procede à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 165-A/2013, de 23 de dezembro, que cria o Fundo de Reestruturação do Setor Solidário e estabelece o seu regime jurídico, à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 120/2015, de 30 de junho, que estabelece os princípios orientadores e o enquadramento a que deve obedecer a cooperação entre o Estado e as entidades do setor social e solidário, e à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 240/2015, de 14 de outubro, que estabelece o regime legal da transmissão dos estabelecimentos integrados do Instituto da Segurança Social, I. P. e respetivos apartamentos de autonomização, para a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Decreto-Lei n.º 39/2017, de 4 de abril Altera as atribuições da Cooperativa António Sérgio para a Economia Social - Cooperativa de Interesse Público de Responsabilidade Limitada, que passa a ser a entidade responsável pela promoção das políticas na área do voluntariado, aproximando as sinergias do setor da economia social e do voluntariado e, por conseguinte, potenciando um desenvolvimento socioeconómico mais equilibrado e solidário. Decreto-Lei n.º 54/2017, de 2 de junho Cria a «cooperativa na hora», simplificando e agilizando o processo de criação de cooperativas. Lei n.º 66/2017, de 9 de agosto Procede à primeira alteração ao Código Cooperativo, permitindo a sua afetiva aplicação. Lei nº 75/2017, de 17 de agosto Estabelece o regime aplicável aos baldios e aos demais meios de produção comunitários possuídos e geridos por comunidades locais integrados no setor cooperativo e social dos meios de produção (revoga a Lei nº 68/1993). Decreto-Lei n.º 84/2017, de 21 de julho Simplifica os procedimentos de restituição de IVA às instituições particulares de solidariedade social, às Forças Armadas, às forças e serviços de segurança e aos bombeiros. Decreto-Lei n. º143/2017, de 29 de novembro Integra um representante das cooperativas na Comissão Permanente do Setor Social e Solidário - alargando a participação, no quadro da cooperação entre o Estado e as entidades do setor social e solidário, às cooperativas do ramo da solidariedade social equiparadas a IPSS - e prorroga o prazo de cedência de estabelecimentos sociais à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Decreto-Lei n.º 28/2018, de 3 de maio Cria o Fundo para a Inovação Social, que tem por objeto a realização de operações de coinvestimento de capital e quase capital e de facilitação do acesso ao financiamento em sociedades sob a forma comercial que se qualifiquem como Pequenas e Médias Empresas e entidades da economia social, implementadoras de Iniciativas de Inovação e Empreendedorismo Social (IIES). Decreto-Lei n.º 59/2018, de 2 de agosto Aprova o Código das Associações Mutualistas. Decreto-Lei n.º 37/2019, de 15 de março Clarifica o regime transitório de supervisão das associações mutualistas. Assinalo assim, de forma sumária e informativa, as mais recentes reformas legais do setor da economia social para a que o conhecimento das mesmas possa alimentar, de forma racional e desapaixonada, o debate frutuoso que melhor conduza ao seu desenvolvimento. |