A ECONOMIA SOCIAL- PROXIMIDADE E DISTANCIAMENTO
Eduardo Graça Presidente da CASES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Chegados ao décimo número desta publicação, a que demos o nome de Revista Economia Social – Leituras & Debates, aproveito para assinalar a disponibilidade dos que nela têm aceitado colaborar, sempre a título gracioso, o que muito nos honra, contribuindo para aprofundar o debate em torno dos temas da economia social, abrindo caminho para que floresça a ideia da criação de uma “academia da economia social” que densifique o pensamento e a doutrina versando sobre a economia social.
A CASES nada mais exercita, através desta iniciativa, se não as suas atribuições e competências, almejando a abordagem de uma maior diversidade de temas, sob diversos ângulos de observação, prezando a pluralidade ideológica, de um setor tão diverso, pela história e natureza das suas “famílias”, mas convergente em seus princípios e valores. Assim prosseguiremos apesar do contexto adverso suscitado pela pandemia designada por COVID-19. A este propósito julgo não ser despiciendo deixar plasmada uma breve reflexão sobre um dos males maiores provocados pela COVID-19 – para além dos efeitos clínicos da doença, mortes e sequelas (ainda mal conhecidas) provocadas nos curados –, qual seja a designação de uma das medidas preconizadas para a prevenir: o designado “distanciamento social” (no lugar do “distanciamento físico”). Esta infeliz (diria, catastrófica) designação, colide frontalmente com os princípios, e práticas, basilares do quotidiano da vida em sociedade desde tempos imemoriais, fundados no gregarismo e na proximidade social. Ora a proximidade tem vindo, no discurso desta pandemia, a ser abordada por defeito, desmerecendo a sua importância e impacto no comportamento dos cidadãos, normalizando uma política de assunção do medo que, queiramos ou não, integra um movimento mais vasto que potencia a limitação das liberdades e o enfraquecimento da democracia. A economia social situa-se, pelos seus princípios e prática generalizada das entidades que a integram, nos antípodas do “distanciamento social”, prestando serviços de proximidade, a partir do seu enraizamento nas comunidades locais, contribuindo fortemente para a coesão social e o desenvolvimento sustentável das regiões, em particular no interior do país, sujeito, desde há décadas, a um processo de desinvestimento material e de perda de capital humano. Em Portugal, a economia social é uma realidade consolidada integrando no seu perímetro um vasto conjunto de entidades de natureza jurídica diversa que as três Contas Satélite da Economia Social (CSES), concretizadas no âmbito de uma parceria com o INE, com dados de 2010, 2013 e 2016, permitem conhecer nas suas variadas dimensões, quantitativas e qualitativas. Segundo os dados desta última CSES, este setor integra mais de 71 mil entidades, representando 3% do PIB, 6,1% do emprego remunerado a tempo completo, e 5,3% das remunerações na economia nacional, tendo crescido significativamente na última década considerando as variáveis mais relevantes. Essa evolução deverá ser confirmada, ou infirmada, pela quarta edição da CSES a realizar em 2021, com dados de 2019 e 2020. A informação estatística, disponibilizada pela CSES, confirma que a economia social, em Portugal, constitui um conglomerado económico-social com peso relevante na economia e na sociedade, através da atividade das suas entidades, a todos os níveis, em particular, na produção de bens e serviços transacionáveis e na ação social comunitária. Mas as palavras só não bastam. Nesta área da economia social, como em tantas outras, o país precisa de pensamento renovador, reflexão aprofundada, iniciativa e ação modernizadoras, cuja relevância mais se agiganta nos tempos difíceis das crises, como a presente, que exigirá, no próximo futuro, um gigantesco esforço de inovação, recuperação e reconstrução do setor com os olhos postos na reafirmação da sua identidade doutrinária e no reforço da prática dos princípios inerentes à sua vocação identitária: proximidade, cooperação e solidariedade. Assim sem prejuízo das medidas de emergência que têm vindo a ser tomadas, como consequência da COVID19, o setor da economia social não pode perder de vista a sua consolidação e desenvolvimento estratégico. Enuncio, de forma sintética, alguns dos pontos estruturantes que, a meu ver, não podem ser esquecidos, nem subalternizados, para a afirmação da economia social em Portugal:
Em tempo de pandemia, face ao futuro incerto que nos espera, a economia social com as suas virtudes e defeitos, faz falta ao país para criar mais riqueza autossustentada, mais serviços sociais de proximidade, mais emprego digno e permanente, contribuindo para a coesão social e territorial.
Lisboa, 1 de outubro de 2020 |