MARTA MONTERROSO ROSAS
Professora Auxiliar Convidada na Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, no Porto. Doutora em Ciências Jurídicas (2023) pela Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa. Membro do Centro de Estudos e Investigação em Direito (Católica Research Centre for the Future of the Law). Leciona e investiga na área do Direito Civil, com especial enfoque no reforço da autonomia e dos meios jurídicos de apoio destinados a pessoas em situação de maior vulnerabilidade. |
I. Introdução
Segundo os dados da última Conta Satélite para a Economia Social (CSES)[1], no ano de 2020 existiam, em Portugal, 73851 entidades a integrar o setor. Este conjunto de entidades reparte-se por diversos grupos, como sejam: cooperativas (2,9%), associações mutualistas (0,1%), misericórdias (0,5%), fundações (0,8%), subsetores comunitário e autogestionário (2,2%) e associações com fins altruísticos (93,4%). No que diz respeito às atividades desenvolvidas por estas entidades destacam-se as atividades de cultura, comunicação e atividades de recreio (mais de 40% do setor), seguidas das atividades religiosas (quase 12%). Logo após, constata-se que cerca de 9% (8,9% em 2020) foram classificadas na atividade dos serviços sociais. Como exemplos de atividades incluídas nos serviços sociais, podem referir-se “serviços de apoio (social) à criança, à juventude, aos idosos, às pessoas com deficiência e às famílias, abrigos temporários, serviços de emergência e resgate, apoio a refugiados, atividades de formação ou aconselhamento vocacional, entre outras”[2]. Serviços de saúde de hospitais e estabelecimentos de cuidados continuados integrados, com alojamento, lares de idosos, entre outras, integram a secção da saúde[3]. Nos termos da Lei de Bases da Economia Social (Lei n.º 30/2013, de 8 de maio), as entidades que incorporam o setor desenvolvem uma atividade económico-social que prossegue, direta ou indiretamente, o interesse geral da sociedade[4]. De resto, a referida Lei de Bases “optou, quanto à delimitação do conceito de economia social, por uma técnica combinada, ou seja, complementando a definição de economia social constante do art. 2.º por uma enumeração aberta das entidades da economia social (art. 4.º) e pela enunciação dos seus princípios orientadores (art. 5.º)”[5]. Nos termos do art. 2.º da Lei de Bases, “entende-se por economia social o conjunto das atividades económico-sociais, livremente levadas a cabo pelas entidades referidas no artigo 4.º (…)” da Lei (n.º 1), sendo que aquelas atividades “têm por finalidade prosseguir o interesse geral da sociedade, quer diretamente quer através da prossecução dos interesses dos seus membros, utilizadores e beneficiários, quando socialmente relevantes” (n.º 2)[6]. O primeiro princípio orientador da atuação das entidades da economia social referido no art. 5.º do mesmo diploma reporta-se ao “primado das pessoas e dos objetivos sociais” (al. a). São várias as entidades que integram o setor da economia social e que se dedicam à prestação de serviços a pessoas em situação de vulnerabilidade. Pense-se, por exemplo, nas cooperativas de solidariedade social, cujo objetivo “(…) se concretiza numa clara missão de assistência a situações de vulnerabilidade social e económica, assentando num paradigma de intervenção social, dando expressão aos valores do altruísmo e da solidariedade”[7], tais como o apoio a pessoas em idade avançada e, em qualquer idade, o apoio a pessoas com deficiência ou noutra situação de vulnerabilidade e/ou dependência. Ainda, em termos gerais, nas diversas entidades com estatuto de IPSS: as atividades que desenvolvem – e que, como nota D. Meira[8], justificam a discriminação positiva de que beneficiam por parte do Estado – têm por missão ajudar pessoas em situações de debilidade económica e social[9]. [1] Conta Satélite da Economia Social 2019/2020, Eduardo Pedroso, Edna Neves (CASES) Cristina Ramos, Carina Rodrigues (INE), Coleção de Estudos de Economia Social n.º 17, disp. em https://cases.pt/wp-content/uploads/2023/08/Conta-Satelite-2019-2020.pdf . [2] Quadro 12 da Conta Satélite da Economia Social 2019/2020. [3] Ibidem. [4] Vd. Meira, Deolinda, “O fim mutualístico desinteressado ou altruísta das cooperativas de solidariedade social”, CIRIEC- Revista jurídica de economía social y cooperativa, 2020, 221-247. [5] Meira, Deolinda, “A lei de bases da economia social portuguesa. Breve apresentação”, Cooperativismo e Economía Social, nº 35 (2012-2013), pp. 231-236, p. 232. [6] Para a enunciação das entidades em causa, cfr. o art. 4.º da Lei de Bases. [7] Meira, Deolinda, “O fim mutualístico…”, cit., p. 233. [8] Meira, Deolinda, “Breves notas sobre el marco jurídico del sector de no mercado de la economía social en portugal - especial referencia a las instituciones particulares de solidaridad social”, Dos decenios actividad universitaria en economía social, cooperativismo y emprendimiento desde el Instituto Universitario IUDESCOOP (R. Chaves Ávila), IUDESCOOP, Valencia, 2023, pp. 409 e ss., p. 411. [9] Ibidem. |
1. Introduction
According to data from the latest Social Economy Satellite Account (SESA)[1], in 2020 there were 73851 entities in the sector in Portugal. This set of entities is divided into several groups, such as: cooperatives (2.9%), mutual associations (0.1%), holy houses of mercy (0.5%), foundations (0.8%), community and self-managed subsectors (2.2%) and associations with altruistic goals (93.4%). Regarding the activities carried out by these entities, stands out activities of culture, communication, and recreation activities (more than 40% of the sector), followed by religious activities (almost 12%). Soon after, it was found that about 9% (8.9% in 2020) were classified in the activity of social services. Examples of activities in social services include "(social) support services for children, youth, the elderly, persons with disabilities and families, temporary shelters, emergency and rescue services, refugee support, vocational training or counselling activities, among others”[2]. Health services of hospitals and integrated long-term care establishments, with accommodation, nursing homes, among others, are part of the human health services section[3]. Under the terms of the Framework Law on the Social Economy (Law No 30/2013 of 8 May), the entities that incorporate the sector carry out an economic and social activity that pursues, directly or indirectly, the general interest of society[4]. Moreover, the Framework Law "opted, as regards the definition of the concept of social economy, for a combined technique, that is to say, complementing the definition of social economy contained in Article 2 by an open list of social economy entities (Article 4) and by the enunciation of its guiding principles (Article 5)"[5]. According to Article 2 of the Framework Law, "social economy means all the economic and social activities freely carried out by the entities referred to in Article 4 (...)" of the Law (paragraph 1), and those activities "have the purpose of pursuing the general interest of society, either directly or through the pursuit of the interests of its members, users and beneficiaries, where socially relevant" (paragraph 2)[6]. The first guiding principle for the actions of social economy entities referred to in Article 5 of the same law refers to the "primacy of people and social objectives" (paragraph a). There are several entities that are part of the social economy sector and are dedicated to providing services to people in vulnerable situations. Think, for example, of social solidarity cooperatives, whose objective is "(...) embodied in a clear mission of assistance to situations of social and economic vulnerability, based on a paradigm of social intervention, giving expression to the values of altruism and solidarity"[7], such as support for people of advanced age and, at any age, support for people with disabilities or in other situations of vulnerability and/or dependency. Also, in general terms, in the various entities with IPSS status[8]: the activities they develop – and which, as noted by D. Meira[9], justify the positive discrimination they benefit from by the State – have the mission of helping people in situations of economic and social debility[10]. [1] Social Economy Satellite Account 2019/2020, Eduardo Pedroso, Edna Neves (CASES) Cristina Ramos, Carina Rodrigues (INE), Coleção de Estudos de Economia Social no. 17, avaiable at: https://cases.pt/wp-content/uploads/2023/08/Conta-Satelite-2019-2020.pdf [2] Table 12 of the Social Economy Satellite Account 2019/2020. [3] Ibidem. [4] Vd. Meira, Deolinda, “O fim mutualístico desinteressado ou altruísta das cooperativas de solidariedade social”, CIRIEC- Revista jurídica de economía social y cooperativa, 2020, 221-247. [5] Meira, Deolinda, “A lei de bases da economia social portuguesa. Breve apresentação”, Cooperativismo e Economía Social, no. 35 (2012-2013), pp. 231-236, p. 232. [6] For the list of the entities concerned, cf. Article 4 of the Framework Law. [7] Meira, Deolinda, “O fim mutualístico…”, cit., p. 233. [8] IPSS - Private Institutions of Social Solidarity (translator's note). [9] Meira, Deolinda, “Breves notas sobre el marco jurídico del sector de no mercado de la economía social en portugal – especial referencia a las instituciones particulares de solidaridad social”, Dos decénios actividad universitaria en economía social, cooperativismo y emprendimiento desde el Instituto Universitario IUDESCOOP (R. Chaves Ávila), IUDESCOOP, Valencia, 2023, pp. 409 e ss., p. 411. [10] Ibidem Translated by CASES team (Filipa Farelo, Eduardo Pedroso and Edna Neves) |