Menu
Revista ES - Economia Social
  • Home
  • atual
  • ARQUIVO
  • Estante
  • Glossário
  • Quem Somos
  • Contactos
  • Home
  • atual
  • ARQUIVO
  • Estante
  • Glossário
  • Quem Somos
  • Contactos
Revista ES n.11 ― ​dezembro 2020
Imagem
POR






​

NOTA DE LEITURA: ENSAIOS SOBRE ECONOMIA SOLIDÁRIA DE PAUL SINGER
​​Rui Namorado
Professor Jubilado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra
​. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
1. Paul Singer é um economista brasileiro de prestígio internacional; professor universitário e político, figura de  referência  no campo da economia solidária. Nasceu na Áustria em 1932, oriundo de uma família judaica, forçada  pela ocupação nazi a emigrar para o Brasil em 1940, onde se fixou em São Paulo.
​
Em 1951, concluiu o curso de eletrotécnica na Escola Técnica Getúlio Vargas de São Paulo, tendo exercido a profissão entre 1952 e 1956. Filiou-se  no Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, tendo militado no movimento sindical.  Como metalúrgico, foi um dos líderes da histórica greve dos 300 mil, que paralisou a indústria paulista por mais de um mês, em 1953. Em 1954,tornou-se cidadão brasileiro. Em 1959, concluiu o curso de Economia da Universidade de São Paulo (USP).  No fim dos anos 50, militou no Partido Socialista Brasileiro (PSB). Foi um dos fundadores da Organização Revolucionária Marxista, Política Operária (Polop),radicada  na ala esquerda desse partido.

Em 1960, iniciou funções docentes na Universidade de São Paulo (USP), onde se doutorou em Sociologia em 1966. Estudou Demografia, em Princeton (USA), voltando à USP como Professor Titular, nas Faculdades de Economia, Administração e Contabilidade. Em 1968, apresentou sua tese de livre-docência, Dinâmica populacional e Desenvolvimento.

Privado dos seus direitos políticos pela ditadura militar imposta pelo golpe de Estado de 1964, foi aposentado compulsivamente, em 1969. Integrou o grupo  de professores e investigadores  expulsos da USP que fundou o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP), importante instituição na área das ciências sociais  que foi uma instância de relevo na resistência à ditadura; e onde trabalhou até 1988. Voltou a ensinar  em 1979 na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).  

Foi um dos fundadores  do Partido dos Trabalhadores (PT).Em 1989, por convite da Prefeita de São Paulo, Luiza Erundina, foi Secretário Municipal de Planejamento de São Paulo, até 1993. Especialista  e grande impulsionador da economia solidária no Brasil ,  participou na criação da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares da USP em 1998, tendo  sido o seu coordenador académico .

Em 2003, foi nomeado pelo Governo Federal do Presidente Lula da Silva como Secretário Nacional de Economia Solidária (SENAES), no Ministério do Trabalho e Emprego. Foi reconduzido no mesmo cargo no mandato seguinte, bem como nos mandatos da Presidente Dilma Rousseff. Em 11 de maio de 2016, depois de 13 anos à frente da Secretaria Nacional de Economia Solidária, foi afastado em simultâneo com a Presidente Dilma, pelo golpe de Estado que levou ao poder o anterior Vice-presidente Temer e abriu caminho a uma profunda reversão política e social.

Paul Singer é autor de um vasto conjunto de livros, tendo também colaborado em várias revistas culturais, políticas e científicas. As suas inúmeras entrevistas são preciosas ilustrações do seu pensamento e fontes de um manancial de informações relevantess.
 
2.  O que é a economia solidária na perspetiva de Paul Singer? Sem menosprezar as suas virtualidades como resposta imediata à desigualdade social e ao sofrimento dos pobres e dos explorados, o autor valoriza nela o seu potencial de transformação social. De uma transformação social que aponta para um pós-capitalismo que consubstancie os seus valores emancipatórios, libertadores, democráticos e solidários.  A realidade brasileira incrusta-se na sua perspetiva, mas o que ocorre noutros lugares não é esquecido.

Para Paul Singer, a economia solidária é um espaço que incorpora as tradições democráticas e emancipatórios do cooperativismo, do mutualismo, do solidarismo democrático e do associativismo popular. Os protagonistas dos movimentos sociais que a integram são sempre submetidos a um olhar crítico, mas fraterno.

A sua radicalidade anticapitalista está impregnada por uma valorização inequívoca e incondicional da democracia, como horizonte irrenunciável de qualquer sociedade humana e como matriz fundadora de qualquer modelo pós-capitalista digno de esperança.
 
3. Neste livro conjuga-se uma abordagem teórica e doutrinária da economia solidária, que valoriza em pleno a sua profundidade histórica, com a sua ancoragem na realidade brasileira. Desdobra-se em duas partes, cada uma das quais com oito textos.

A primeira reflete o modo como o autor concebe teórica e doutrinariamente a economia solidária, valorizando-a como combate à exclusão dos explorados e como possível oportunidade emancipatória, rumo a um futuro que consubstancie um humanismo pleno. A segunda conduz-nos, através de experiências da economia solidária no Brasil, em interação com o protagonismo político de Paul Singer, como membro do governo federal, tendo como pano de fundo a sua proximidade com as organizações envolvidas.

É claro que na primeira parte não deixa de estar presente a realidade brasileira, como atmosfera relevante, enquanto na segunda são claras múltiplas repercussões teóricas e doutrinárias. Há uma relativa osmose entre os dois tipos de abordagem, a qual se projeta num discurso coloquial que nunca dispensa o rigor. Um discurso sempre enraizado na realidade, mas ao qual nunca falta uma ambição futurante.

Este livro mostra como trabalhadores, excluídos e pobres podem construir uma resistência prática às sequelas de uma sociedade injusta. A partir da realidade brasileira manifesta-se uma problemática universal, através de um diálogo vivo com experiências congéneres espalhadas pelo mundo.

É certo que, desde meados de 2016, a economia solidária no Brasil está cercada. O golpe de estado institucional então ocorrido não derrubou apenas um governo legítimo. Abriu a porta a uma regressão social, fruto de um paroxismo neoliberal que cada vez mais se mostra como o verdadeiro objetivo estratégico da rotura constitucional. Mas a economia solidária no Brasil está socialmente enraizada. Pode resistir a esta adversidade. Pode fazer parte de um dispositivo de esperança que seja horizonte e caminho.
 
4. Para concluir, sublinho as grandes linhas de força que estruturam este livro. É nítido o seu enraizamento no marxismo, em simbiose com uma atenção permanente à história do movimento operário. Um enraizamento alheio a qualquer dogmatismo e distante de qualquer seguidismo acrítico. Paralelamente, é nítido um compromisso com a democracia , sem reservas nem subterfúgios.

O papel da Igreja Católica e de instituições dela dependentes é valorizado, através de uma ampla referência a múltiplos casos que o ilustram. Do mesmo modo, é salientado o contributo do PT para a expansão e o enraizamento da economia solidária. Não é esquecida a simbiose e a sinergia, abundantemente documentadas, entre a economia solidária e os movimentos sociais. Está assim sempre presente ao longo do livro a sua inserção na tradição cooperativa, uma sistemática valorização da lógica autogestionária e do ímpeto emancipatório.
​
Pode pois dizer-se, em síntese, que estamos perante uma virtuosa sinergia entre saber académico, experiência de exercício do poder político e fraterna proximidade quanto aos movimentos sociais.
 
Abril 2018

​POST-SCRIPTUM


Já depois de ter enviado o texto que acabam de ler para a redação, fui surpreendido pela notícia triste de que Paul Singer nos havia deixado. É sempre muito pesado o começo da saudade de todos aqueles que merecem a nossa homenagem. Mas a nossa mágoa é ainda maior porque pudemos fruir o seu convívio quando por diversas vezes veio a Portugal e a Coimbra. Ouvi-lo, conversar com ele, beneficiar dos seus conhecimentos tecidos por uma vasta e diversificada experiência, por um apurado rigor teórico e por uma incansável esperança doutrinária, são memórias irremovíveis.
​
Foi uma grande honra que Paul Singer tivesse aceitado publicar o livro acima comentado na coleção que dirijo. Foi com júbilo que recebi dele uma expressa apreciação favorável desta edição. Continuará presente entre nós pelos seus textos, pela memória do que foi a sua vida e pela perenidade dos movimentos sociais em que se envolveu. Não o esquecemos.
ENG






​

READING NOTE – ESSAYS ON PAUL SINGER’S SOLIDARY ECONOMY
​​​Rui Namorado
Professor at the School of Economics, University of Coimbra
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
1. Paul Singer is an internationally renowned Brazilian economist; university professor and politician, a figurehead in the field of Solidary Economy. He was born in Austria in 1932, from a Jewish family, forced by the Nazi occupation to emigrate to Brazil in 1940, where they settled in São Paulo.

In 1951 he completed the electrical engineering course at Escola Técnica Getúlio Vargas in São Paulo, having exercised this profession between 1952 and 1956. He joined the São Paulo Metalworkers Union and was active in the union movement. As a metallurgist, he was one of the leaders of the historic 300,000 strike, which paralysed the São Paulo industry for more than a month, in 1953. In 1954, he became a Brazilian citizen. In 1959, he completed the Economics course at the University of São Paulo (USP). In the late 1950s, he was a member of the Brazilian Socialist Party (PSB). He was one of the founders of the Marxist Revolutionary Organisation, Polária Operária (Polop), rooted in the left wing of this party.

In 1960, he started teaching at the University of São Paulo (USP), where he obtained a doctorate in Sociology in 1966. He studied Demography in Princeton (USA), returning to USP as a Full Professor, at the Schools of Economics, Administration and Accounting. In 1968, he submitted his thesis, Population Dynamics and Development.
​
Deprived of his political rights by the military dictatorship imposed by the 1964 coup, he was compulsorily retired in 1969. He was part of the group of professors and researchers expelled from USP who founded the Brazilian Centre for Analysis and Planning (CEBRAP), an important institution in the field of the social science, which was a prominent bulwark in the resistance to the dictatorship; and where he worked until 1988. He returned to teaching in 1979 at the Pontifical Catholic University of São Paulo (PUC-SP).

He was one of the founders of the Workers’ Party (PT). In 1989, invited by the Mayor of São Paulo, Luiza Erundina, he was the Municipal Planning Secretary of São Paulo, until 1993. Specialist and great driver of the Solidary Economy in Brazil, he was involved in the creation of USP’s Popular Cooperative Technological Incubator in 1998 and was its academic coordinator.

In 2003 he was appointed by the Federal Government of President Lula da Silva as National Secretary for Solidary Economy (SENAES), in the Ministry of Work and Employment. He was reappointed to the same position in the following term, and also with President Dilma Rousseff. On May 11th, 2016, after 13 years at the helm of the National Secretariat for Solidary Economy, he was dismissed simultaneously with President Dilma during the coup that brought former Vice President Temer to power and paved the way for deep political and social reversal.

Paul Singer is the author of a wide range of books and also collaborated in several cultural, political and scientific magazines. His numerous interviews are precious illustrations of his thinking and rich sources of relevant information.

2. What is Solidary Economy in Paul Singer’s view? Without underestimating its potential as an immediate response to social inequality and the suffering of the poor and the exploited, the author values its potential for social transformation. From social transformation that points to a post-capitalism embodying its emancipating, liberating, democratic and solidary values. Brazilian reality is ingrained in his perspective, but what happens elsewhere is not forgotten.

For Paul Singer, Solidary Economy is a space that incorporates the democratic and emancipating traditions of cooperativism, mutualism, democratic solidarism and popular associations. The protagonists of social movements that are part of it are always subjected to a critical but fraternal look.

His anti-capitalist radicalism is impregnated by unequivocal and unconditional valuation of democracy as an indispensable horizon of any human society and the founding matrix of any post-capitalist model worthy of hope. 

3. This book combines a theoretical and doctrinal approach to Solidary Economy, which fully values its historical depth, anchored in the Brazilian reality. It is divided into two parts, with eight texts each.

The first reflects the way in which the author conceives Solidary Economy theoretically and doctrinally, valuing it as fight against the exclusion of the exploited and a possible emancipating opportunity, towards a future that embodies full humanism. The second leads us, through Solidary Economy experiences in Brazil, in interaction with the political prominence of Paul Singer, as a member of the federal government, with the background of his proximity to the organisations involved.

It is clear that in the first part Brazilian reality is still present, as a relevant atmosphere, while in the second part there are clear theoretical and doctrinal repercussions. There is a relative osmosis between the two types of approach, projected in a colloquial discourse that never dispenses with rigor. A speech always rooted in reality, but never lacking future ambition.

This book shows how workers, the excluded and the poor can build practical resistance to the aftermath of an unjust society. From Brazilian reality, a universal problem manifests itself, through living dialogue with similar experiences scattered over the world.

It is true that, since mid-2016, Solidary Economy in Brazil is sieged. The institutional coup that then took place did not just overthrow a legitimate government. It opened the door to social regression, the result of neoliberal paroxysm that increasingly proves to be the true strategic aim of the constitutional rupture. But Solidary Economy in Brazil is socially rooted. You can resist this adversity. It can be part of a device of hope that is both horizon and path.

4. To conclude, I stress the great lines of force that structure this book. It is clear that it is rooted in Marxism, in symbiosis with permanent attention to the history of the workers’ movement. A rooting outside any dogmatism and distant from any uncritical following. At the same time, there is a clear commitment to democracy, without reservations or subterfuge.

The role of the Catholic Church and institutions dependent on it is valued, through broad reference to multiple cases that illustrate it. Likewise, PT’s contribution to the expansion and rooting of Solidary Economy is highlighted. The abundantly documented symbiosis and synergy between Solidary Economy and social movements is not forgotten. Thus, the insertion in the cooperative tradition is always present throughout the book, a systematic valuation of self-management logic and emancipating impetus.

It can therefore be said, in short, that we face a virtuous synergy between academic knowledge, experience of holding political office and fraternal proximity to social movements.

​April 2018

























Revista ES n.11 ― ​dezembro 2020
Imagem
Rua Américo Durão, n.º 12-A, Olaias, 1900-064 Lisboa
cases@cases.pt