Escrevo num dos dias iniciais de uma guerra com consequências incalculáveis. Não poderia deixar de repudiar esta guerra, seus mentores e atores, solidário com as suas vítimas, em defesa da paz e da concórdia entre os povos e as nações.
O acontecimento mais relevante, no âmbito da Economia Social, ocorrido nos últimos anos, foi a apresentação em dezembro de 2021, pela Comissão Europeia, do Plano de Ação para a Economia Social.
Sem prejuízo das incertezas suscitadas pela pandemia e, no presente momento, pelos ventos de guerra que ameaçam varrer a Europa com as suas inevitáveis consequências na reorientação das prioridades políticas da EU e de cada país, este Plano de Ação enquadra e abre caminho ao relançamento da Economia Social, a mais resiliente às crises de todos os setores de propriedade dos meios de produção, incentivando a aliança entre os governos e a sociedade civil em prol da criação de Planos de Ação Nacionais para a Economia Social. Não podíamos deixar de saudar, pois, após longos anos de trabalhos e expetativas frustradas, a adoção pela Comissão Europeia deste Plano de Ação – 2022/2030, que assinala um novo capítulo na vida da Economia Social, criando condições para que este setor ganhe mais visibilidade e consistência assim como reconhecimento político.
Apoiamo-lo nas suas grandes linhas, sem prejuízo da necessidade de um debate aprofundado que clarifique, com mais precisão, entre outras questões, alguns conceitos adotados, o alcance de parcerias propostas ou sugeridas, em particular com o setor privado lucrativo, assim como as medidas e calendários explicitamente adotados.
É neste sentido que temos vindo a trabalhar desde logo através de uma análise crítica do próprio Plano de Ação, expressa num documento que se apresenta autonomamente nesta edição da revista, visando a abertura de um debate a nível nacional que envolva o maior número de parceiros do setor.
Este Plano significa o reconhecimento, por parte das instituições europeias, da importância e potencial da Economia Social, abrindo caminho à definição de uma política específica dirigida ao setor, a colocação em prática de mecanismos concretos de atuação que promovem e apoiam as entidades de Economia Social que deverão ser aproveitados da melhor forma, nomeadamente a nível nacional, transformando-os em objetivos concretos, ambiciosos e mensuráveis, unificados num Plano de Ação Nacional para a Economia Social.
Alertamos, no entanto, no âmbito da UE, para a necessidade de salvaguardar a autonomia dos Estados na produção de legislação de enquadramento da Economia Social, em particular, não adotando diretivas vinculativas no que respeita, nomeadamente, ao estatuto da empresa social - deixando essas prerrogativas aos governos nacionais.
A questão da inovação e da empresa social, entre outras que o Plano de ação suscita, levam-me a retomar de forma breve algumas reflexões acerca do relacionamento contraditório, ao mesmo tempo confluente e divergente, entre os setores privado lucrativo (capitalista) e o da Economia Social.
Sem demérito para a história e papel do capitalismo no desenvolvimento da humanidade ao qual, a meu ver, a Economia Social, ao contrário do que alguns defendem, não se constitui como alternativa global, mas tão-somente como parceira, emerge a urgência do debate acerca da confluência de valores e princípios diversos que, estrategicamente, poderão confluir num novo conceito de organização no qual o económico não capturará o social nem o social condicionará o económico.
Outro grande desafio que sempre emerge é o da intercooperação, ou seja, o de encontrar caminhos que promovam a prática da cooperação no seio do próprio do movimento da Economia Social, aglutinando energias na diversidade, densificando o debate, estimulando a academia, formando os práticos, entrosando os protagonistas, criando sinergias entre os mundos do saber e do fazer, da lucratividade e da não lucratividade, tendo em vista abrir à renovação de ideários sem perda na fidelidade a valores e princípios distintivos.
Os tempos mais recentes, de crise pandémica com suas nefastas consequências económico-sociais que ameaçam persistir, e o ressurgimento de conflitos bélicos, tendem a estimular e a fazer crescer o interesse das sociedades e organizações pela questão da Economia Social e do empreendedorismo, seus princípios e valores, em que avultam os da democracia, da liberdade, da cooperação e intercooperação.
Em Portugal e na Europa será desejável que prossiga e se aprofunde, impulsionado pelo surgimento deste Plano de Ação de ambição europeia, sem abrandamento da parte de qualquer dos protagonistas, o trabalho pelo reconhecimento do setor e pelo tema da Economia Social em toda a sua extensão e complexidade.
As entidades da Economia Social têm que encarar os desafios do futuro, de forma positiva, ganhar escala em cada um dos seus subsetores, eficiência e eficácia, adotando, sem prejuízo da fidelidade aos seus princípios, uma gestão profissional que lhes permita adotar com sucesso estratégias nas quais a sustentabilidade terá um papel cada vez mais relevante.
Após um longo período histórico de vazio no que respeita à reinvenção do conceito de Economia Social, com suas virtualidades e constrangimentos, quer no plano político, institucional, legal, doutrinário, económico e social, a UE, com este Plano de Ação, ousa dar um passo em frente perante o qual nenhum país membro, nem o ecossistema da Economia Social, pode ficar indiferente.
Aproveitemos a oportunidade que a nossa pertença à UE nos propicia para ir mais longe de forma segura, persistente e propositiva para o prosseguimento desse grande desígnio de tornar mais fortes, nos planos social e económico, as forças que lutam em prol do BEM COMUM.
MENSAGEM DE SOLIDARIEDADE COM O POVO UCRANIANO Perante a agressão militar desencadeada pela Rússia à Ucrânia, com seu cortejo de destruição e morte, a direção da Cooperativa António Sérgio para a Economia Social (CASES) manifesta a sua solidariedade com o povo ucraniano, condenando toda e qualquer violação do direito internacional e dos direitos humanos. Apelamos à paz, à segurança e ao respeito pelo direito internacional, juntando-nos aos apelos pela adoção da via diplomática como a única solução aceitável para a resolução do conflito.
Enviamos a nossa solidariedade ao povo ucraniano e, em particular, às organizações da economia social ucraniana, seus dirigentes e membros, nesta hora de sofrimento e resistência, assim como à comunidade ucraniana residente em Portugal. As entidades da economia social portuguesa estarão, apesar de todas as dificuldades resultantes da pandemia, na primeira linha do apoio e solidariedade aos refugiados ucranianos, em particular as crianças, que nesta hora trágica busquem Portugal como país de acolhimento.
Lisboa, 2 de março de 2022
I am writing in the early days of a war that is likely to have incalculable consequences. In solidarity with its victims, in defence of peace and harmony between peoples and nations, I find myself obliged to thoroughly repudiate this war, its mentors and its actors.
The most prominent event in the field of Social Economy in the last few years has been the European Commission’s presentation of the Action Plan for the Social Economy in December 2021.
Notwithstanding the uncertainties raised by the pandemic and, at this moment, by the winds of war that threaten to sweep Europe with their inevitable consequences in the reorientation of EU political priorities and of each country, this Action Plan frames and opens the way to the relaunch of the Social Economy. Of all types of ownership of the means of production, this sector is perhaps the most crisis resilient and this new plan encourages governments and civil society to work together to create National Action Plans for the Social Economy.
After so many years of hard work and frustrated expectations, we can only welcome the European Commission’s adoption of the 2022/2030 Action Plan. This represents a new chapter in the life of the Social Economy and establishes the conditions for this sector to gain more visibility and consistency, as well as political recognition.
We support its broad outlines, although there may be a need for an in-depth discussion that will lead to a more precise clarification of some of the concepts, the scope of the proposed or suggested partnerships, particularly those with the private profit sector and the various explicit measures and schedules, amongst other issues.
This is why, from the very outset, we have been working through a critical analysis of the Action Plan itself, expressed in a commentary that is presented independently in this edition of the journal. We want to open up a national debate that will involve as many sector partners as possible.
We would point out, however, that, in EU terms, States must remain free to produce their own framework legislation for the Social Economy. The EU should not adopt binding directives, particularly as regards the status of the social enterprise. Such prerogatives should be left to national governments.
Among other issues raised by the Action Plan, those of innovation and social enterprise lead me to return briefly to specific reflections on the contradictory, yet confluent and divergent, relationship between the private profit-seeking (capitalist) sector and the Social Economy sector.
I would not downplay the history and role of capitalism in the development of humanity. Furthermore, I do not believe that the Social Economy offers a global alternative to capitalism, as some would posit. It is more of a partner. If we accept this, then there is an urgent need for debate on the confluence of diverse values and principles that, strategically, could converge in a new concept of organisation in which the economic does not capture the social and the social does not limit the economic.
Another great challenge that always emerges is that of inter-cooperation, that is, of finding ways that promote the practice of cooperation within the Social Economy movement itself. This may take the form of pooling energies in diversity, intensifying the debate, stimulating the academy, training the practitioners, mingling the protagonists, creating synergies between the worlds of knowing and doing, of profitability and non-profitability. All of this will foster the renewal of ideals without having to break from distinctive values and principles.
Our recent experiences of the pandemic and its negative economic and social consequences, which threaten to persist, and the resurgence of conflict, all tend to stimulate and increase the societal and organisational interest in the issue of the Social Economy and entrepreneurship, particularly its principles and values of democracy, freedom, cooperation and inter-cooperation.
One truly good thing that could happen in Portugal and in Europe would be for the work to earn recognition for the sector and for the issue of the Social Economy, in all its breadth and depth, to continue and deepen, unabated and driven by this new Action Plan imbued with European ambition.
Social Economy entities have to face the challenges of the future in a positive manner. Each subsector must gain scale, efficiency and effectiveness, adopting, whilst retaining their principles, a professional management structure that allows them to successfully work with strategies in which sustainability will play an increasingly key role.
After a prolonged period of nothingness as regards the reinvention of the concept of the Social Economy, with its virtues and constraints, whether at the political, institutional, legal, doctrinal, economic or social level, the EU, through its Action Plan, has dared to take a step forward. No member country, nor the Social Economy ecosystem itself, can afford to remain indifferent to this.
Let us seize the opportunity that our membership of the EU gives us to go further, in a safe, persistent and proactive way, in our pursuit of this great design of ensuring that the forces that fight for the COMMON GOOD become socially and economically emboldened.
MESSAGE OF SOLIDARITY WITH THE UKRAINIAN PEOPLE
Faced with the military aggression unleashed by Russia against Ukraine, with its trail of destruction and death, the board of the António Sérgio Cooperative for the Social Economy (CASES) expresses its solidarity with the Ukrainian people and strongly condemns any violation of international law and human rights. We call for peace, security and respect for international law and add our voice to the calls for the use of diplomacy, as this is the only acceptable way to resolve the conflict.
We express our solidarity with the Ukrainian people in general and with Ukrainian social economy organisations, their leaders and members in particular in this, their hour of suffering and resistance. We are also solidary with the Ukrainian community living in Portugal. Despite all the difficulties ensuing from the pandemic, entities in the Portuguese social economy will be at the forefront of the support for, and solidarity with, those Ukrainian refugees, particularly children, who, at this tragic time, seek a safe haven in Portugal.